domingo, 28 de fevereiro de 2010

Enchente 'de calendário' ainda é ameaça para Trizidela do Vale

O Jornal pequeno traz uma matéria sobre a enchente do Rio Mearim e a preocupação da população de Trizidela do Vale com a aproximação do inverno. Abaixo a matéria na íntegra:

TRAGÉDIA ANUNCIADA

Quase um ano após a cheia do Mearim ter deixado cerca de 90% do município debaixo d’água, nada foi feito para evitar uma nova tragédia

O presidente Lula e a ocupante do governo maranhense Roseana Sarney só fizeram ‘marketing da enchente’ ao sobrevoar áreas inundadas

POR OSWALDO VIVIANI

Ainda estão na memória de muitos maranhenses – e até de gente de outros cantos do Brasil – as cenas da tragédia, provocada em abril e maio do ano passado pela cheia do rio Mearim, em Trizidela do Vale, município com pouco mais de 18 mil habitantes, localizado a 276 km de São Luís. Hoje, quase um ano depois que toda a parte baixa da cidade (aproximadamente 90% do município) foi coberta pelas águas, deixando 17 mil pessoas desabrigadas, 3 mortas e um prejuízo de mais de R$ 20 milhões, a situação de vulnerabilidade de Trizidela é a mesma. “Nada mudou. Se acontecer este ano uma enchente como a do ano passado, em que o rio subiu mais de 6 metros, a tragédia vai se repetir”, admitiu ao JP na Estrada o próprio prefeito de Trizidela, Jânio de Sousa Freitas, o “Jânio Balé” (PDT), que está em seu segundo mandato.

“A enchente virou um evento que já faz parte do calendário da população de Trizidela. E muita gente inclusive já se prepara de antemão para tirar proveito dela, como donos de canoas, lanchas, carros, caminhões, que cobram caro para ajudar a retirar as pessoas das áreas de risco. Se aproveitam da tragédia”, disse o prefeito. Para Jânio Balé, a única medida que resolveria o problema seria a mudança da cidade de lugar, ou seja, a transferência para áreas altas de casas, estabelecimentos comerciais e prédios públicos localizados a menos de 2 km das margens do rio Mearim (veja na página 2).

Cidadania torta – A noção enviesada de cidadania, que faz pessoas tirarem proveito de uma catástrofe natural sazonal, se estende, em Trizidela do Vale, a outras situações. São comuns, no desenrolar da tragédia, casos de moradores que recebem do Poder Público e de doadores particulares colchões, kits dormitórios, filtros e alimentos e os vendem a comerciantes da região, que fazem plantão na cidade assim que o Mearim começa a subir.

cheia do rio Mearim continua sendo uma ameaça, que no ano passado serviu
para marketing pessoal de Roseana, Lula e o ‘aspone’ Francisco Escórcio

Mas o caso mais grave de cidadania torta em Trizidela é o de moradores de áreas de risco que são beneficiados com casas construídas com dinheiro público em locais aos quais as águas não chegam, e a seguir vendem ou alugam os imóveis, voltando a morar na beira do rio. O JP na Estrada confirmou essa situação num conjunto de 100 casas construído na administração anterior, de Paulo Antonio Barros da Silva, o “Paulo Maratá” (hoje no PRTB). (veja na página 3).

‘Marketing da enchente’ – Confirmamos também o jogo de cena marqueteiro dos governos estadual e federal à custa da enchente do ano passado – tão condenável quanto a ação dos oportunistas que tiram proveito financeiro da tragédia.

No auge da cheia, jornais e blogs da oligarquia sarneysista divulgaram a foto da ocupante do governo maranhense Roseana Sarney Murad (PMDB) e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobrevoando a área alagada e prometendo todo tipo de ajuda aos municípios maranhenses atingidos. Até o “aspone” Francisco Escórcio tirou uma “casquinha” da tragédia, visitando a região afetada a bordo de um helicóptero do Exército.

Os passeios aéreos, no entanto, só serviram para a autopromoção de Roseana, Escórcio e Lula. O prefeito Jânio Balé conta: “Eles nem sobrevoaram Trizidela do Vale. E a ajuda tanto federal como estadual chegou tarde, quando o município já havia providenciado, com seus próprios recursos, medidas emergenciais, como aluguel de caminhões, abrigos, cestas básicas etc.”.

O prefeito também lembrou que o governo Lula, o mesmo que pareceu expressar preocupação com a grande enchente de 2009, nem se deu ao trabalho de dar retorno ao Município sobre um projeto para desassorear o rio Mearim, enviado ao governo federal (Ministério da Integração Nacional) no primeiro ano da gestão Jânio Balé (2005). As obras de macrodrenagem custariam R$ 10 milhões e resolveriam, segundo Balé, “70% do problema das enchentes”.

Enquanto soluções definitivas para a “enchente de calendário” vão ficando pelo caminho por razões diversas, a Prefeitura de Trizidela do Vale tenta novamente convencer parte das mais de 6 mil pessoas que vivem na área de risco de inundação a se transferir para casas construídas longe do rio Mearim. O projeto de habitação beneficiará 270 famílias, mas só as que têm moradia de taipa à beira do rio. O beneficiado terá de assinar um contrato pelo qual fica proibido, por 5 anos, de alugar ou vender o imóvel recebido.

A Prefeitura também tenta evitar os efeitos catastróficos de uma nova cheia pressionando o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) a controlar a vazão da barragem do rio Flores, localizada em Joselândia (a mais de 90 km de Trizidela). Para a Prefeitura, a enchente de 2009 só se tornou a pior dos últimos 35 anos porque não houve manutenção da barragem – abertura e fechamento periódicos das comportas – antes de começarem as chuvas, o que fez com que a barragem “sangrasse” pelas laterais, correndo sério risco de se romper. As águas liberadas pela barragem chegaram rapidamente em Trizidela, causando a elevação repentina em mais de 4 metros do nível do rio Mearim num dia em que nem chovia na cidade e pegando a população desprevenida.

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